quarta-feira, 17 de junho de 2009

Europeias 2009







No passado dia 07 de Junho, as eleições europeias marcaram o passo do quotidiano actual.
O devir da sociedade portuguesa, de tão mordaz, parece remeter-nos para uma ironia queirosiana no seu esplendor mor.
O panorama político agitou-se. Os protagonistas revelaram-se. Os actores secundários foram subtilmente (ou nem por isso) desmascarados. Vejamos os factos e atentemos aos dados:

As eleições europeias foram, mirabile visu,reveladoras e, por que não considerá-lo, bem taxativas da conjuntura actual. Se, para muitos analistas, estas eleições se revelaram surpreendentes, para outros, como eu (e sem qualquer pitada prepotente), foram o culminar de um contexto agreste que se materializou numa resposta lapidar a uma indignação generalizada.
Vivemos em crise, dirão uns. Estamos em crise, afirmarão outros. Continuamos em crise, insistirão outros. Sentimos a crise, proferirão outros. Até aqui, nada de novo, nem de surpreendente, nem discutível porventura.
Todavia, analisemos caso a caso.

a)O Partido Socialista foi o grande perdedor. Consensual! Não só perdeu Vital Moreira com o seu ar demodé e pouco carismático, para além de confuso, incongruente e desconexo, desconstruindo inúmeras vezes a sua fidelização ao aparelho rosa.
Perdeu também, sobretudo e de modo clarividente, José Sócrates e a sua entourage. Ruíu o mito da invencibilidade socrática, porventura bem mais cedo do que o racionalmente suposto. Afinal, o primeiro-ministro parece relegado para uma realidade da qual ele próprio jamais pressuporia. Após este cartão bem alaranjado, terá três meses para se recompor, repensar estratégias, fazer umas quantas concessões populistas e rever matrizes comunicacionais, ao fim e ao cabo, o seu verdadeiro calcanhar de Aquiles. Quanto à arrogância desmedida e despudorada terá seguramente os dias contados! (26,6%)

b) O Partido Social Democrata foi o principal vencedor. Primeiro na chegada à meta, primus inter pares, reconquistou o protagonismo político nacional passando, a partir de agora, a marcar a agenda política (para o melhor ou para o pior)!
Paulo Rangel arrancou definitivamente para a ribalta. De forma meteórica, destaca-se como líder parlamentar, assume-se como cabeça de lista «possível» nas europeias e eis que se destaca como a grande revelação desta campanha. Mais, consegue a proeza (por antítese a Vital, embora curiosamente ambos professores) de conjugar o «factor revelação» com o «factor consagração». E logo um «dois em um»...
Uma palavra de destaque, ainda, para Manuela Ferreira Leite. Pela convicção, pela determinação, mas, fundamentalmente, pela coerência. Algo a que começamos a não estar habituados, embora não seja arrebatadora, carismática ou empolgante...Contudo, calou o partido. E na hora da vitória, ninguém reclama e todos resgatam os louros.
Vejamos se saberão potenciar o capital que lhes foi conferido. (31,7%)

c) O Bloco de Esquerda conquistou, em apenas dez anos, a proeza de se tornar (pelo menos momentaneamente) a terceira força política portuguesa, ultrapassando tangencialmente a CDU (coligação dos Comunistas com os Verdes). Vejamos se será sol de pouca dura, o verdadeiro teste virá daqui a três meses, mas proeza como esta merece sempre uma referência especial, mais não seja por constituir um dado novo na ciência política nacional, embora já expectável atendendo ao perfil identitário do BE. (10, 7%)

d) A Coligação Democrática Unitária, pese embora o seu discurso (aliás natural e esperado) laudatório aos resultados conquistados, sentiu claramente um sabor agridoce. Por um lado, saboroso por ter aumentado quantitativamente o número de eleitores. Acresce o facto de que não perdeu eleitores. Efectivamente, aumentou-os! Por outro, insatisfatótio e até frustrante por ter sido ultrapassada pelo BE como terceira força política nacional. Dirão alguns paladinos da astúcia política que as legislativas daqui a três meses negarão ou confirmarão os resultados, mas certo é, porém, que há que saber ler e (tentar) interpretar os resultados. Brevemente, assistiremos a novos episódios. (10, 7%)

e) O Centro Democrático Social/Partido Popular, conseguiu também uma pequena grande vitória, contudo assinalável. Contra todas as expectativas alheias, contrariadas eventualmente apenas pelos próprios correligionários (do CDS/PP subentenda-se), subiram percentualmente, elegeram dois deputados e cresceram eleitoralmente. Daí a comoção no rescaldo da noite eleitoral... (08,4%)

f) Uma palavra de incentivo para o Movimento Esperança Portugal, idealizado pelo talento e carisma verdadeiramente singulares de Rui Marques que, personalizados em Laurinda Alves, se afirmaram como a mais relevante das pequenas forças partidárias. Veremos o que o futuro lhes reserva.

No entanto, convém reflectirmos sobre três condições fundamentais que circunscrevem estas eleições:

1) Com uma abstenção na casa dos 63, 1% e uma percentagem de votos em branco e nulos na ordem dos 6,6%, dá que pensar. Algo vai mal na política portuguesa...

2) As sondagens revelaram-se instrumentos imprecisos, pouco claros e erróneos. Equívocos tanto nos valores como no prório sentido de voto. A rever!

3) Indubitavelmente, estas eleições não poderão ser consideradas como um espelho fiel de umas legislativas antecipadas, quer pela sua nomenclatura, quer pelos seus objectivos, como ainda pelos contextos e protagonistas. Mas, não restem dúvidas! Estas eleições foram um belo ensaio geral do que pode acontecer daqui a três meses.

Haja bom-senso, repensem-se estratégias, afinem-se diapasões porque se a maioria absoluta de cor rosada parece agora uma miragem bem distante, os dados estão definitivamente lançados e tudo pode acontecer.
Podem crer, caros amigos, em parcos três meses PS e PSD poderão cantar vitória. Dependendo dos valores, dos princípios, dos programas mas, acima de tudo, da capacidade de estabelecer empatias com o eleitorado, dependerá o resultado final das próximas legislativas.
E o povo, soberano, premiará quem se conseguir pôr no seu lugar, vislumbrando - e sentindo na pele - uma realidade dura, factual e objectiva de quem vive do seu trabalho.
Também a nós, cidadãos atentos,conscientes e participativos, nos competirá desmistificar Paul Valéry quando este afirmou que «a política é a arte de impedir que as pessoas participem nos assuntos que lhes dizem respeito».
Atentemos ao futuro.

Quo vadis?



Fernando Peixoto ©

13 comentários:

Anónimo disse...

Professor,

Passei por aqui e vergo-me perante a sua análise. Que categoria!!! Não que duvidasse...
Não o vi comentar na noite das eleições ?!

Um grande abraço.

José Carlos (IEFP)

Anónimo disse...

Professor Fernando Peixoto,

Embora o tempo voe, é nestas alturas que parece que se está a passar agora.
Grande análise.
Um beijinho e bom f-d-s,

Rita Alves (P/B...)

Anónimo disse...

Pensava que o seu blog era apenas de poesia mas afinal parece ser bem eclético.
Boa surpresa!
Continue com a língua bem afiada...

Cumpts,

Lídia S.

Professor disse...

Fernando, aproveito para saudá-lo.
Sempre que posso venho aqui visitá-lo e, confesso, fiquei muito bem impressionado com a lucidez incisiva do seu comentário político.
Lembra-se daquelas acaloradas conversas, sobre política e derivados, que nos levavam ao rubro? Velhos tempos, irrepetíveis, pelo menos nas mesmas condições.
Decerto me lembrarei no próximo café...

Um abraço com estima,

E.M.

Anónimo disse...

Olá Fernando,

Com que então como tem andado o "menino"?
Ninguém sabe nada, nem café, nem whisky, nada... e os amigos? Só pensa em trabalho?
Vá lá, descontraia, relaxe, brinque com a vida, da mesma forma com que brinca com o intelecto.
(Já agora, admito, o teu comentário sobre as eleições é brilhante!!!
Acabada de chegar a casa, vim visitar-te e ainda bem.
Meu querido, fico à espera de novidades.

Beijocas para ti e para a tua fantástica mulher, (já tenho saudades vossas)...

Tucha

Anónimo disse...

Engenheiro, como tem passado?
Vim visitar este espaço e fico muito satisfeito com a isenção da análise política. Aliás, como sempre justo.
Um grande abraço,

Pedro Costa

Anónimo disse...

Meu caro Fernando,

Para além da extraordinária veia poética, uma elevada capacidade de análise política. Mas não surpreende, ademais acaba por ser a extensão natural das suas conversas pessoais tão inflamadas!
Um abraço,

Tomás Lencastre

Anónimo disse...

Professor,

A capacidade de chegar aos outros é fantástica. Ainda esta semana comentávamos, entre colegas que docentes há muitos mas mestres muito poucos.
Temos político!
Podemos votar em si...kkkkkkk?
Tudo de bom e um grande abraço,

o "Artista"

Anónimo disse...

Professor Fernando Peixoto,

Passei por aqui para cumprimentá-lo e para desejar-lhe, a si e aos seus, um óptimo S. João com tudo de bom como bem merece.
Um grande abraço em nome de todos,

11º9

Rosa Peixoto disse...

Querido Fernando

Passando para te fazer um cucu e ver novidades.
Questões de politica não é o meu forte,pois estou noutro país,sendo naturalizada belga,estou mais ao corrente dos assuntos daqui,mas pelo que vejo e leio sobre a politica acho que a diferença entre os dois países não é muito grande...
Um lindo f.d.s para vcs...
Beijocas.
Rosa

Sylvia Cohin disse...

Caríssimo Fernando,
Depois de "um longo e tenebroso inverno", venho te visitar para matar saudades e ler com imenso prazer, tudo que escreves.
Hoje não quero comentar nem aplaudir, mas tão somente deixar um sinal de afeto saudoso, com toda admiração pela pessoa brilhante que mora em si. Esta admiração é o fruto da lenta descoberta que fazemos pouco a pouco, de alguém que se descortina através do tempo e das circunstâncias, põe-se à mostra através de seus feitos, de suas idéias, e deixa plantado no éter o sémen de seu valor que se espalha, fertilizando por onde passa.
Por mais bela que seja uma planta, seu valor maior enconde-se na qualidade de suas raízes que podem ser superficiais, ou profundas; São elas, silenciosas obreiras a percorrer caminhos ocultos sob a terra, que fazem o esplendor das copas e das floradas!
E por sentir tão evidente (e presente) o valor de tuas raízes, com grande amizade, digo-te: "Que bela árvore com seus bons frutos!"
Desde o outro lado do mar, um abraço atlântico da amiga,
Sylvia Cohin

Anónimo disse...

Professor,

Como vai o grande guru?
Passei por aqui e aproveito para lhe desejar umas excelentes férias.
Tem aqui um blog muito interessante, como não poderia deixar de ser.
Poesia, política, só falta mesmo diversificar ainda mais os temas...

Um grande abraço,

Tiago G.

Anónimo disse...

Então, por onde anda Vossa Excelência?
Finalmente o regresso. E em grande.
Tens de ser mais assíduo, pois o clube de fãs assim o clama.

Beijinhos,

Tucha